O ecossistema de compra e venda de criptomoedas cresceu muito rapidamente nos últimos anos. Se, até final de 2022, os rendimentos provenientes desses ativos não estavam previstos nos códigos tributários e, portanto, não havia tributação de criptomoedas, a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2023 (OE 2023) deu resposta a esse crescimento e veio alterar essa condição.
O que são criptomoedas
As criptomoedas, como o nome sugere, são um tipo de moeda digital baseada no conceito da criptografia, isto é, cujos dados são encriptados por uma questão de segurança. As criptomoedas são guardadas em carteiras digitais (“digital wallets”) e, tal como as moedas tradicionais, usadas como método de pagamento para todo o tipo de bens e serviços.
As transações de criptomoedas são registadas publicamente numa base de dados digital designada de “blockchain”, a qual é partilhada num sistema interligado (peer-to-peer) dos vários participantes na economia da criptomoeda. Desta forma, as criptomoedas são um tipo de dinheiro descentralizado, ao contrário das moedas tradicionais, que recorrem a entidades como bancos e governos para as supervisionar.
Novas unidades de uma criptomoeda são geradas através de um processo chamado mining (mineração), pelo qual um utilizador usa um ou vários computadores para resolver problemas matemáticos de elevada complexidade que verificam as transações existentes dessa moeda.
As criptomoedas são inseridas numa categoria global designada de “criptoativo”, que inclui também outros tipos de ativos encriptados digitalmente através de um processo semelhante, como os NFTs (non-fungible tokens).
O Código do IRS (CIRS) define um criptoativo no artigo 10.º, n.º 17, como sendo toda a representação digital de valor ou direitos que possa ser transferida ou armazenada eletronicamente recorrendo à tecnologia de registo distribuído ou outra semelhante
, sendo que o n.º 18 acrescenta que excluem-se do disposto no número anterior os criptoativos únicos e não fungíveis com outros criptoativos
.
Desde o surgimento do Bitcoin em 2009 que as criptomoedas continuam a crescer e a proliferar economicamente, mas a legislação portuguesa ainda não tinha conseguido acompanhar esse crescimento, o que muda com o novo regime fiscal de tributação destinado às criptomoedas.
O novo regime fiscal de tributação de criptomoedas
Com a entrada em vigor do OE 2023, aprovado pela Lei n.º 24-D/2022, de 30 de dezembro, foi introduzida uma série de alterações ao CIRS para integrar diversos tipos de rendimentos provenientes de criptoativos, de forma a serem tributados especificamente no âmbito das categorias B (rendimentos empresariais e profissionais), E (rendimentos de capitais) e G (incrementos patrimoniais), além de passarem a ser incluídos no âmbito dos impostos sobre o património.
Categoria B: tributação de operações relacionadas com a emissão de criptomoedas
Em sede de IRS, conforme estabelecido na alínea o) do n.º 1 do artigo 4.º, passaram a ser consideradas atividades comerciais e industriais as operações relacionadas com a emissão de criptoativos, incluindo a mineração, ou a validação de transações de criptoativos através de mecanismos de consenso
.
Como tal, a tributação de criptomoedas no âmbito da categoria B é feita segundo as mesmas regras aplicáveis aos restantes rendimentos desta categoria: quando enquadráveis no regime simplificado, a tributação é efetuada mediante a aplicação dos coeficientes estabelecidos no n.º 1 do artigo 31.º do CIRS aos rendimentos obtidos, especificamente:
- 0,15 às operações com criptoativos, excetuando rendimentos provenientes de mineração;
- 0,95 aos rendimentos provenientes da mineração de criptoativos.
Deste modo, no âmbito da categoria B, os rendimentos obtidos no âmbito das operações com criptomoedas só são sujeitos a tributação em 15% do seu valor, que é depois sujeito a englobamento com os restantes rendimentos, ficando 85% isentados. A exceção são os relacionados com atividades de mining, que são considerados em 95% devido ao impacto ambiental que lhes é associado.
O n.º 17 do artigo 31.º acrescenta também que os rendimentos decorrentes de operações com criptoativos consideram-se obtidos no momento da respetiva alienação onerosa.
Categoria G: tributação de mais-valias resultantes da alienação de criptomoedas
No que respeita aos rendimentos da categoria G, passam a constituir mais-valias, por meio do acréscimo da alínea k) ao n.º 1 do artigo 10.º do CIRS, os ganhos que resultem da alienação onerosa de criptoativos que não constituam valores mobiliários, desde que estes sejam detidos por um período inferior a 365 dias. Quer isto dizer que, quando os criptoativos são detidos por um período igual ou superior a 365 dias, as mais-valias resultantes são isentas de tributação em sede de IRS.
A este tipo de rendimentos é aplicada a taxa especial de 28% prevista no artigo 72.º, n.º 1, do CIRS, quando o contribuinte não opte pelo englobamento. Os ganhos sujeitos a tributação são constituídos pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimentos de capitais (categoria E), sendo caso disso (artigo 10.º, n.º 4, alínea a)).
Categoria E: tributação de rendimentos decorrentes de operações com criptomoedas
Conforme definido no artigo 5.º do CIRS, são considerados rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas provenientes de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, assim como da respetiva modificação, transmissão ou cessação, com exceção dos rendimentos tributados nas outras categorias de IRS.
No caso das criptomoedas, a alínea u) que foi acrescentada ao n.º 2 do artigo 5.º define que quaisquer formas de remuneração decorrentes de operações relativas a criptoativos, geradas de forma passiva pela aplicação de capital, como staking delegado ou off-chain, se incluem no âmbito dos frutos e vantagens económicas previstos na categoria E, sendo tributados como mais-valia no momento da alienação dos criptoativos recebidos.
Estas remunerações também são sujeitas à taxa especial de 28% prevista no artigo 72.º, quando não tiverem sido sujeitos a retenção na fonte.
Tributação da transmissão de criptomoedas
Assumindo-se as criptomoedas como ativos, não é só em sede de IRS que as respetivas operações passam a ser tributadas: passam também a ser sujeitas a imposto de selo:
- na transmissão gratuita de criptoativos (por exemplo, em caso de herança), aplica-se uma taxa de 10% de imposto de selo;
- nos serviços de intermediação de criptoativos, aplica-se uma taxa de 4% sobre o valor das respetivas comissões.
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